Comentado por Dra Karine Miranda.
É fato que o progresso tecnológico e a assistência medica possibilitaram aumento da expectativa de vida. Contudo, também é importante lembrar que com o envelhecimento populacional houve aumento significativo do número de pessoas com doenças incuráveis, com sequelas e complicações.
Neste contexto, o modelo assistencial curativo, onde todos os recursos são empregados para cura e prolongamento da vida, já não atende a demanda. É preciso “des-hospitalizar” a doença terminal e o processo de morte, contrariamente ao que foi feito nas últimas décadas.Torna-se necessário o alívio do sofrimento físico, psíquico e espiritual, e não mais a cura.
Com este fim, surgem os cuidados paliativos, cujo foco de atuação está nos problemas decorrentes da doença prolongada, incurável e progressiva, prevenindo o desconforto e proporcionando a melhor qualidade de vida possível às pessoas doentes e seus familiares.
Nesta fase final da vida, um processo que pode levar dias, semanas ou meses, procedimentos invasivos, tais como hemodiálise, ventilação mecânica (respiração através de aparelhos), reanimação cardíaca, e até exames de imagem e laboratoriais, nem sempre têm indicação médica, pois podem causar desconforto, prolongar o sofrimento e onerar os custos da assistência desnecessariamente.
Aqui no Brasil, até bem pouco tempo, cabia apenas ao médico e familiares do doente decidir sobre quais cuidados seriam realizados no fim de vida. A partir de 31 de agosto de 2012, a Resolução 1.995 do Conselho Federal de Medicina (CFM), estabelece os critérios para que qualquer pessoa, desde que maior de idade ou emancipada e plenamente consciente, possa definir junto ao seu médico quais os limites terapêuticos na fase terminal.
Sob o nome formal de diretiva antecipada de vontade ou testamento vital, é feito registro do desejo expresso do paciente de quais procedimentos serão considerados pertinentes e aqueles aos quais não quer ser submetido em caso de terminalidade da vida. Isto permitirá que a equipe que o atende tenha o suporte legal e ético para cumprir essa orientação, desde que de acordo com o Código de Ética Médica. Nada poderá ser feito para abreviar a vida do doente (eutanásia), pois o objetivo é humanitário, proporcionando uma morte digna, sem a utilização de meios fúteis e inúteis para doenças incuráveis.
De acordo com esta resolução do CFM, o registro da diretiva antecipada de vontade pode ser feito pelo médico assistente em sua ficha médica ou no prontuário do paciente, não são exigidas testemunhas ou assinaturas, pois o médico possui fé pública e seus atos têm efeito legal e jurídico, e não há necessidade de registro em cartório.
O testamento vital é facultativo, poderá ser feito em qualquer momento da vida (mesmo por aqueles que gozam de perfeita saúde) e pode ser modificado ou revogado a qualquer momento. O único que pode alterá-lo é o próprio paciente e não poderá ser contestado por familiares, prevalecendo, portanto, a vontade do doente.
Sabemos que os conflitos emocionais e éticos que envolvem a fase final de vida são comuns. O que se propõe não é privar o paciente dos recursos diagnósticos e terapêuticos que o conhecimento médico pode oferecer, mas utilizá-los de forma adequada , levando em consideração os benefícios que podem trazer e os malefícios que devem ser evitados.
Referências: Manual de Cuidados Paliativos da ANCP / Portal do Conselho Federal de Medicina
Karine Miranda – Geriatra e Clínica
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